Projeto de Lei do Imposto de Renda (PL 1.087/2025)

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O cenário tributário brasileiro está prestes a viver uma de suas maiores transformações em décadas com a aprovação do novo Projeto de Lei do Imposto de Renda (PL 1.087/2025). A proposta, que agora segue para o Senado, promete aliviar o bolso da classe média e, ao mesmo tempo, redesenhar a forma como as altas rendas são tributadas no país.

Com a iminência dessas mudanças, muitas dúvidas surgem e dominam as conversas sobre planejamento financeiro:

  • Quem exatamente ficará isento do Imposto de Renda a partir de 2026?
  • Se eu ganho um pouco acima do novo teto de isenção, terei algum benefício ou cairei em uma "armadilha fiscal"?
  • Como essa nova regra afeta o cálculo do imposto sobre o 13º salário?
  • De onde virá o dinheiro para custear essa isenção?

Neste guia completo, vamos mergulhar fundo no texto do projeto de lei para responder a essas e outras perguntas. Prepare-se para entender, com exemplos práticos e uma análise detalhada, como seu bolso será impactado e quem realmente ganha com as novas regras do jogo.

Parte 1: O Alívio Fiscal para Milhões de Brasileiros

O coração da reforma para a maioria da população está em um novo e engenhoso mecanismo: a redução do imposto devido. Em vez de simplesmente alterar as faixas da tabela progressiva, a lei cria um sistema de descontos automáticos que beneficia diretamente quem ganha até R$ 7.000,00 por mês.

Vamos detalhar ponto a ponto.

1. Afinal, quem ficará totalmente isento do Imposto de Renda?

A regra é clara e o impacto é direto: qualquer contribuinte com rendimentos tributáveis mensais de até R$ 5.000,00 passará a ter seu imposto zerado.

Isso não acontece por uma mudança na tabela de alíquotas, mas sim pela criação de um "desconto de ofício", detalhado no Art. 3º-A do projeto. Na prática, o cálculo funcionará da seguinte forma:

  1. Primeiro, o sistema da Receita Federal calculará o imposto que você deveria pagar normalmente, aplicando as alíquotas da tabela progressiva sobre seu rendimento.
  2. Em seguida, a própria lei concede uma redução de valor idêntico ao imposto que foi apurado, fazendo com que o valor final a pagar seja sempre R$ 0,00.

Exemplo prático: Imagine um profissional CLT com um rendimento tributável de R$ 4.800,00. Pelas regras atuais, após as deduções, ele teria um imposto a pagar de aproximadamente R$ 268,00. Com a nova lei, o cálculo seria:

  • Imposto apurado pela tabela: R$ 268,00
  • Desconto de ofício (Art. 3º-A): - R$ 268,00
  • Imposto a Pagar: R$ 0,00

Simples assim. O desconto automático anula o imposto devido, garantindo a isenção na prática.

2. E se eu ganho um pouco mais de R$ 5.000? Terei algum benefício?

A resposta é sim, e este é um dos pontos mais inteligentes do projeto. Para evitar um salto brusco na tributação (o chamado "efeito degrau", onde ganhar R$ 1 a mais poderia significar pagar centenas de reais em imposto), a lei cria uma faixa de transição suave para quem tem rendimentos tributáveis entre R$ 5.000,01 e R$ 7.000,00.

Neste intervalo, você também terá direito a um desconto, mas ele será decrescente. A lógica é simples: quanto mais perto seu rendimento estiver de R$ 5.000, maior será o desconto. Conforme ele se aproxima de R$ 7.000, o desconto diminui até zerar completamente.

A lei estabelece uma fórmula matemática precisa para esse cálculo: Desconto = 1.095,11 - (0,156445 x seu rendimento tributável)

Vamos ver em números:

  • Rendimento de R$ 5.500,00:
    • Desconto = 1.095,11 - (0,156445 x 5.500)
    • Desconto = 1.095,11 - 860,45
    • Desconto aplicável: R$ 234,66
  • Rendimento de R$ 6.500,00:
    • Desconto = 1.095,11 - (0,156445 x 6.500)
    • Desconto = 1.095,11 - 1.016,89
    • Desconto aplicável: R$ 78,22
  • Rendimento de R$ 7.000,00:
    • Desconto = 1.095,11 - (0,156445 x 7.000)
    • Desconto = 1.095,11 - 1.095,11
    • Desconto aplicável: R$ 0,00

Essa transição suave garante que seja sempre financeiramente vantajoso ter um aumento de salário, eliminando distorções e trazendo mais justiça fiscal.

3. Então, quem ganha acima de R$ 7.000 não tem nenhuma mudança?

Exatamente. O § 2º do artigo é muito claro: contribuintes com rendimentos tributáveis mensais superiores a R$ 7.000,00 não terão direito a este novo mecanismo de redução. Para este grupo, o cálculo do Imposto de Renda continua seguindo as regras da tabela progressiva atual, sem a aplicação de nenhum novo desconto.

4. E como fica o 13º Salário?

O projeto de lei pensou nisso! O § 4º do artigo estende o benefício explicitamente para o 13º salário. Esta é uma inclusão fundamental, pois o 13º possui uma tributação "exclusiva na fonte".

Isso significa que ele é calculado em separado do salário normal do mês, com uma tabela própria, para não inflar artificialmente sua renda em dezembro e jogá-lo em uma alíquota maior. Ao garantir que o mesmo mecanismo de redução (seja o desconto total ou o parcial) se aplique ao 13º, a lei assegura um alívio financeiro extra justamente no período de festas e planejamento para o ano seguinte.

Parte 2: A Conta da Isenção - A Tributação das Altas Rendas

A isenção e a redução do Imposto de Renda para milhões de brasileiros representam um custo de bilhões para os cofres públicos. Para equilibrar essa conta, o Projeto de Lei institui uma nova e significativa forma de arrecadação, focada em quem tem rendimentos elevados e mirando em uma fonte que há décadas é isenta no Brasil: os lucros e dividendos.

Vamos entender as duas faces dessa moeda.

5. A Nova Tributação sobre Lucros e Dividendos

Desde a Lei 9.249/1995, os lucros e dividendos distribuídos por empresas a seus sócios (pessoas físicas) são isentos de Imposto de Renda. A justificativa, na época, era evitar a dupla tributação, já que a empresa já pagava impostos (IRPJ e CSLL) sobre o lucro gerado.

A partir de 2026, essa realidade muda drasticamente para quem recebe valores mais elevados.

Para você que é empresário ou profissional liberal (PJ), o conceito é simples: lucro ou dividendo é o que sobra no fim do mês após pagar todos os custos e impostos da empresa e que você transfere para sua conta pessoal.

Exemplo:

  • Total de notas fiscais emitidas no mês: R$ 20.000
  • Impostos pagos pela empresa (Simples, etc.): R$ 2.000
  • Despesas operacionais da empresa: R$ 1.000
  • Lucro disponível para distribuição: R$ 17.000 (Este valor é o "dividendo" a ser transferido para o CPF do sócio).

O novo Art. 6º-A da lei estabelece as seguintes regras para essa distribuição:

  • O que será tributado? O recebimento de lucros e dividendos por pessoas físicas.
  • Qual a alíquota? Será retido na fonte um imposto de 10%.
  • Quem pagará? Pessoas físicas que receberem mais de R$ 50.000,00 de uma mesma empresa dentro de um mesmo mês.

O ponto mais importante, e que exige máxima atenção, está no detalhe do cálculo: a alíquota de 10% incide sobre o valor total recebido no mês, e não apenas sobre o que excede R$ 50.000,00. Além disso, o § 1º do artigo veda quaisquer deduções da base de cálculo.

Exemplo prático para ilustrar:

  • Se um sócio recebe R$ 50.000,00 em dividendos em um mês, ele continua isento.
  • Porém, se ele receber R$ 50.001,00, o imposto de 10% será calculado sobre o valor total. Ou seja, a retenção na fonte será de R$ 5.000,10.

Para evitar manobras, o § 2º determina que múltiplos pagamentos de uma mesma empresa para o mesmo sócio, dentro do mesmo mês, devem ser somados para a verificação do limite de R$ 50.000,00.

6. O Espelho Anual: O Ajuste na Declaração Final (DAA)

Para garantir que a lógica dos descontos mensais funcione perfeitamente ao longo do ano, o projeto cria o Art. 11-A, que estabelece as mesmas regras de redução para a Declaração de Ajuste Anual (DAA). A DAA é o momento em que a Receita Federal consolida todas as suas receitas e despesas do ano para o cálculo final do imposto.

Na prática, os limites são anualizados:

  • Rendimentos tributáveis anuais de até R$ 60.000,00 (equivalente a R$ 5.000/mês) terão o imposto zerado na declaração final.
  • Rendimentos anuais entre R$ 60.000,01 e R$ 84.000,00 (equivalente à faixa de até R$ 7.000/mês) terão o desconto decrescente aplicado no cálculo final, garantindo que o benefício mensal seja consolidado.

Parte 3: A "Malha Fina dos Milionários" - O Novo Imposto Mínimo (IRPFM)

Se a tributação de dividendos na fonte é o aperitivo, o "prato principal" da arrecadação, que forma a espinha dorsal de toda a reforma, é a criação de um Imposto sobre a Renda da Pessoa Física Mínimo (IRPFM).

Trata-se de uma espécie de "ajuste final" na Declaração Anual para contribuintes com altíssima renda. O objetivo é garantir que eles paguem um percentual mínimo de imposto, independentemente de seus rendimentos serem, hoje, classificados como isentos ou já tributados.

7. O Que é o IRPFM e Quem Precisa se Preocupar?

O Art. 16-A cria essa nova obrigação. Pense nela como uma "verificação anual de conformidade" para quem possui rendimentos elevados.

  • Público-alvo: Pessoas físicas cuja soma de todos os rendimentos no ano (salários, aluguéis, investimentos, dividendos, etc.) seja superior a R$ 600.000,00.
  • Base de Cálculo Ampla: E aqui está o ponto crucial. Para chegar a esses R$ 600 mil, a lei manda somar praticamente tudo, incluindo rendimentos hoje isentos ou tributados exclusivamente na fonte, como lucros e dividendos, rendimentos de LCI/LCA, e até mesmo doações e heranças (com algumas exceções técnicas).

8. Como o IRPFM é Calculado?

O cálculo é complexo, mas a lógica pode ser dividida em etapas:

  1. Apurar a Renda Total Anual: Soma-se quase toda a renda da pessoa física no ano, incluindo as fontes hoje isentas.
  2. Calcular a Alíquota Progressiva: A alíquota do IRPFM varia de 0% a 10% de forma linear, conforme a renda total.
    • Renda de R$ 600.000: Alíquota de 0%
    • Renda de R$ 900.000: Alíquota de 5%
    • Renda de R$ 1.200.000 ou mais: Alíquota de 10%
  3. Calcular o "Imposto Mínimo Bruto": Multiplica-se a alíquota encontrada pela base de cálculo (que possui algumas deduções específicas, como juros de poupança).
  4. Abater o Imposto que Você JÁ Pagou: Deste "imposto mínimo bruto", a lei permite deduzir todo o imposto de renda que você já pagou durante o ano, como:
    • O IR devido na sua declaração de ajuste normal (sobre salários, aluguéis, etc.).
    • O IR retido na fonte sobre aplicações financeiras.
    • Crucialmente, os 10% retidos mensalmente sobre os dividendos que explicamos anteriormente.
  5. Resultado Final: O valor que sobrar dessa conta é o IRPFM a ser pago, somado ao seu imposto de renda final. Se a conta der negativa ou zerar, você não paga nada a mais de IRPFM.

9. A "Trava de Segurança": O Redutor Contra a Dupla Tributação (Art. 16-B)

O legislador previu um problema potencial: somar o imposto da empresa (IRPJ/CSLL) com o novo imposto do sócio (IRPFM) poderia levar a uma carga tributária excessiva e confiscatória sobre o lucro gerado.

Para evitar isso, foi criado um redutor. A regra, de forma simplificada, é: a soma dos impostos (da empresa + do sócio) sobre o lucro distribuído não pode ultrapassar a alíquota nominal que a empresa pagaria sobre seu lucro (geralmente 34% para a maioria das empresas no regime do Lucro Real).

Se a soma ultrapassar esse teto, o governo concede um "desconto" (o redutor) no IRPFM do sócio para ajustar a conta e respeitar esse limite. Isso traz uma importante segurança jurídica, mas exigirá uma contabilidade impecável e um planejamento tributário ainda mais sofisticado.

Conclusão: Um Novo Paradigma Tributário e os Próximos Passos

Este projeto de lei, se aprovado como está, representará a maior e mais profunda mudança no Imposto de Renda da Pessoa Física em décadas. O Art. 2º da nova lei oficializa o fim da era de isenção geral de dividendos, estabelecendo as novas regras de retenção mensal e do imposto mínimo anual.

O cenário que se desenha é duplo:

  • Para a grande maioria dos brasileiros: Um alívio fiscal direto, bem-vindo e de fácil compreensão, com isenção e descontos claros que aumentam a renda disponível.
  • Para empresários, investidores e pessoas de alta renda: Um cenário de complexidade inédita. A era dos rendimentos isentos como principal forma de remuneração parece chegar ao fim, dando lugar a um sistema que exige planejamento, controle e uma contabilidade altamente estratégica.

Você está em boas mãos!

É fundamental ressaltar que, embora o texto detalhado que analisamos tenha sido aprovado com força na Câmara dos Deputados, a jornada deste Projeto de Lei ainda não terminou. A proposta agora segue para o Senado Federal, onde será novamente debatida, analisada pelas comissões e votada em plenário.

Nesta nova etapa, o projeto pode sofrer alterações. Portanto, a versão final da lei pode ter diferenças em relação ao que apresentamos aqui.

Nosso compromisso é continuar acompanhando de perto cada passo dessa tramitação e manter você informado sobre quaisquer mudanças que possam impactar seu planejamento para 2026. Fique de olho no nosso blog!

Tenha uma ótima semana!

Um abraço, Pedro