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1. Introdução
Segundo dados e pesquisas realizadas pelo IBGE em 2024, mais de 38 milhões de brasileiros estão trabalhando de forma informal na iniciativa privada.
A maioria desses casos envolve trabalhos informais autônomos ou o exercício de atividades econômicas em pequenos negócios e comércios sem registro formal.
Com base nessa contextualização, este artigo tem como objetivo abordar os principais aspectos relacionados ao trabalho informal.
A informalidade laboral no Brasil representa um desafio significativo, afetando milhões de trabalhadores que não têm acesso a direitos básicos. Essa situação impacta não apenas a segurança e o bem-estar dos trabalhadores, mas também a economia do país, uma vez que a falta de formalização reduz a arrecadação de impostos e contribuições sociais. Compreender os fatores que contribuem para a informalidade é essencial para a criação de políticas públicas que incentivem a formalização e protejam os direitos trabalhistas.
2. Sobre o trabalho informal
Embora possa parecer vantajoso inicialmente—reduzindo custos para a empresa e aumentando os rendimentos do trabalhador—o trabalho informal pode ser prejudicial para ambos. Para o empregador, há riscos relacionados à fiscalização e possíveis penalidades. Para o empregado, existe o risco de ficar desamparado em casos de acidentes ou doenças, pois não possui cobertura previdenciária, além de não poder se aposentar ou acessar outros benefícios do INSS.
2.1. Características
Uma característica central do trabalho informal é que os trabalhadores não possuem registro ou vínculo formal com a empresa. Em muitos casos, não há nenhum tipo de recolhimento previdenciário.
Além disso, essa informalidade faz com que o empregado perca diversos direitos trabalhistas, como piso salarial adequado, férias remuneradas, jornada de trabalho regulamentada e outros previstos no artigo 7° da Constituição Federal (CF/88) e na CLT.
A ausência de registro formal priva o trabalhador de proteções legais fundamentais, expondo-o a condições precárias e vulnerabilidade social. Sem direitos assegurados, o trabalhador informal fica à mercê de jornadas excessivas, salários abaixo do mínimo e sem acesso a benefícios como férias e licenças remuneradas. Isso também afeta a economia, pois reduz a arrecadação de impostos e contribuições previdenciárias.
2.2. Pejotização
A pejotização é a prática de contratar pessoas jurídicas para a prestação de serviços, sendo uma estratégia fraudulenta adotada por muitas empresas. Essas empresas exigem que o trabalhador abra um CNPJ para efetivar a contratação, com o objetivo de evitar o vínculo empregatício.
Em resumo, a pejotização ocorre quando:
- A empresa contratante exige, no momento da admissão, que o trabalhador constitua uma pessoa jurídica para ser contratado; ou
- A empresa impõe a um antigo empregado a criação de uma pessoa jurídica como condição para continuar trabalhando, resultando na rescisão do contrato de emprego e na continuidade do trabalho sob as mesmas condições, mas como prestador de serviços por meio de pessoa jurídica.
A pejotização visa reduzir custos para a empresa, evitando encargos trabalhistas e previdenciários. No entanto, essa prática prejudica o trabalhador, que perde direitos como 13° salário, FGTS e férias remuneradas. Além disso, a pejotização contribui para a precarização das relações de trabalho e é considerada uma fraude à legislação trabalhista, podendo resultar em sanções para a empresa.
2.3. Vínculo de Emprego
É importante ressaltar que, mesmo sem um vínculo formal inicialmente, o trabalhador informal pode ter seu vínculo de emprego reconhecido em uma reclamação trabalhista ou fiscalização.
Se o empregado desempenha suas funções conforme o artigo 3° da CLT—com habitualidade, onerosidade, subordinação e pessoalidade—o vínculo empregatício é caracterizado. Isso ocorre devido ao princípio da primazia da realidade, que prioriza os fatos reais sobre a forma documental.
O princípio da primazia da realidade protege o trabalhador, garantindo que os direitos trabalhistas sejam assegurados mesmo na ausência de formalização. Isso significa que, se a relação de emprego existe na prática, a legislação reconhece o vínculo, independentemente de contratos ou registros formais, assegurando acesso aos direitos previstos em lei.
3. MEI
O trabalhador informal pode optar por se registrar como Microempreendedor Individual (MEI), conforme a Lei Complementar n° 123/2006.
Esse registro permite a obtenção de um CNPJ, facilitando a abertura de contas bancárias, acesso a empréstimos e emissão de notas fiscais.
O artigo 100, §§ 4° e 8° da Resolução CGSN n° 140/2018 estabelece que a prestação de serviços pelo MEI não deve apresentar pessoalidade, subordinação e habitualidade que caracterizem vínculo empregatício, sob pena de exclusão do Simples Nacional.
Assim, se o MEI for considerado como empregado, inclusive doméstico, o contratante estará sujeito às obrigações tributárias e previdenciárias de um vínculo empregatício, e o MEI poderá ser excluído do Simples Nacional, conforme o artigo 114 da mesma resolução.
O MEI foi criado para formalizar pequenos empreendedores, oferecendo benefícios como tributação simplificada e acesso a direitos previdenciários. Contudo, é crucial que a relação entre MEI e contratante não configure emprego disfarçado. A utilização indevida do MEI para mascarar relações de emprego é ilegal e prejudicial ao trabalhador, além de gerar riscos fiscais e trabalhistas para a empresa contratante.
3.1. Empregado do MEI
Conforme o artigo 105 da Resolução CGSN n° 140/2018 e o artigo 18-C da LC n° 123/2006, o MEI pode contratar um único empregado, que deve receber salário equivalente ao piso da categoria ou ao salário mínimo nacional, se não houver piso definido em Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) ou Convenção Coletiva de Trabalho (CCT).
Se esse empregado precisar se afastar, o MEI pode contratar um substituto durante o período de auxílio por incapacidade temporária, conforme o artigo 105, § 2° da resolução e o artigo 18-C, § 2° da lei. Após a recuperação e retorno do empregado afastado, o substituto deve ser dispensado para manter o enquadramento do MEI.
A possibilidade de contratação de um empregado pelo MEI permite o crescimento do microempreendedor, mas é fundamental respeitar os limites legais para não perder os benefícios do regime. A contratação temporária durante o afastamento do empregado demonstra a flexibilidade do MEI, mas exige atenção para evitar o desenquadramento e as penalidades associadas.
4. Autônomo
Em geral, o trabalhador autônomo exerce suas atividades sem subordinação, podendo atuar em diversas áreas e sendo classificado como contribuinte individual, conforme o artigo 12, inciso V, alíneas “g” e “h” da Lei n° 8.212/91.
Embora o autônomo não seja subordinado ao contratante, é importante observar as disposições do artigo 3° da CLT. De acordo com o artigo 442-B da CLT, para não haver vínculo de emprego, as características mencionadas no subitem 2.3 desta matéria não devem estar presentes.
A distinção entre trabalhador autônomo e empregado é crucial para determinar direitos e obrigações de cada parte. O autônomo tem liberdade na execução de suas atividades, sem subordinação hierárquica. Se houver elementos de subordinação e pessoalidade, pode-se caracterizar vínculo empregatício, implicando em responsabilidades trabalhistas para o contratante.
5. Fiscalização do atributo registro de empregados
De acordo com o artigo 5°, incisos I a IV, da Instrução Normativa MTP n° 002/2021, o auditor fiscal deve:
I – Realizar pesquisas e investigações prévias nos sistemas de informações sobre o empregador a ser fiscalizado;
II – Verificar a existência de empregados em atividade no local de trabalho, utilizando entrevistas, controles de jornada e outros meios necessários;
III – Averiguar documentos ou evidências que comprovem vínculo empregatício com outros empregados não presentes no momento da verificação;
IV – Lavrar auto de infração conforme o artigo 41 da CLT, caso constate admissão sem registro, e conforme o artigo 29 da CLT, se o empregador não tiver anotado a CTPS no prazo legal;
Além disso, se o empregador for notificado para formalizar os vínculos no eSocial, deve enviar o evento S-2200 em até cinco dias úteis, conforme o inciso V do artigo.
A fiscalização é essencial para garantir o cumprimento das leis trabalhistas e proteger os direitos dos trabalhadores. Os auditores têm ferramentas para identificar irregularidades e obrigar a formalização dos vínculos, promovendo a legalidade e evitando a precarização das relações de trabalho.
6. Formalização do vínculo pelo empregador
Se o empregador, após notificação, não formalizar o vínculo no eSocial, será lavrado auto de infração, conforme o artigo 5°, inciso VI, da IN MTP n° 002/2021.
Para evitar sanções, o empregador deve proceder ao registro, informar o eSocial S-2200 e cumprir as obrigações tributárias e acessórias antes da lavratura do auto de infração.
A formalização tempestiva dos vínculos empregatícios demonstra o compromisso do empregador com a legalidade e evita penalidades que podem ser financeiras e reputacionais. Além disso, garante aos empregados acesso a direitos trabalhistas e previdenciários, fortalecendo a relação de trabalho.
6.1. Lançamento do Vínculo de Ofício
Se o empregador não cumprir as determinações, e o auto de infração confirmar a existência da relação de emprego, as informações serão lançadas de ofício.
Conforme o artigo 5°-A da IN MTP n° 002/2021, os registros serão feitos pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, integrando as anotações da CTPS Digital e as bases de dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), de acordo com o artigo 29, § 3° da CLT.
O lançamento de ofício é uma medida que protege o trabalhador, garantindo que seus direitos sejam reconhecidos mesmo diante da inércia do empregador. Isso reforça a importância da formalização e demonstra que a fiscalização possui mecanismos eficazes para assegurar o cumprimento das leis trabalhistas.
7. Efeitos benéficos da regularização
Com a regularização do vínculo de emprego, os trabalhadores passam a ter acesso a diversos benefícios, que serão detalhados nos subtópicos seguintes.
A formalização traz segurança jurídica para ambas as partes. O trabalhador ganha direitos e proteção social, enquanto o empregador estabelece uma relação transparente, evitando riscos legais e fortalecendo a reputação da empresa.
7.1. Direito aos Benefícios Previdenciários
De acordo com o artigo 3°, § 1°, da IN PRES/INSS n° 128/2022, a filiação à Previdência Social ocorre automaticamente com o exercício de atividade remunerada. Após a regularização, o empregado tem direito a benefícios como aposentadoria, auxílio por incapacidade temporária, salário-maternidade, pensão por morte, auxílio-reclusão e salário-família.
É importante notar que alguns benefícios exigem o cumprimento de carência, conforme o artigo 29 do Decreto n° 3.048/99.
A filiação à Previdência Social é fundamental para a proteção do trabalhador em diversas situações. O acesso a benefícios previdenciários proporciona segurança financeira em momentos de vulnerabilidade, como doença ou aposentadoria, contribuindo para a dignidade e qualidade de vida do trabalhador.
7.2. Direito ao Seguro-desemprego
O direito ao seguro-desemprego é outro benefício da formalização. Contudo, além do registro em CLT, o empregado deve cumprir os requisitos do artigo 3° da Lei n° 7.998/90 e ter sido dispensado sem justa causa. As exigências incluem períodos mínimos de trabalho anteriores à dispensa, não estar recebendo outros benefícios previdenciários ou renda própria suficiente, e, quando aplicável, estar matriculado em cursos de qualificação.
O seguro-desemprego oferece suporte financeiro temporário ao trabalhador desempregado, permitindo que ele busque nova colocação sem enfrentar dificuldades imediatas. O cumprimento dos requisitos legais assegura que o benefício seja destinado a quem realmente precisa, mantendo a sustentabilidade do programa.
7.3. Direito ao FGTS
O empregado formalizado tem direito ao FGTS, conforme o artigo 15 da Lei n° 8.036/90, devendo ser depositado até o dia 20 de cada mês, com alíquota de 8% sobre a remuneração.
Em caso de demissão sem justa causa, o empregado tem direito a uma multa de 40% sobre o valor depositado na conta vinculada ao longo do contrato, atualizada monetariamente e acrescida de juros.
O FGTS funciona como uma poupança compulsória, proporcionando ao trabalhador recursos em situações específicas, como aquisição de moradia ou desemprego. A multa rescisória é uma compensação pela perda do emprego, incentivando a estabilidade nas relações trabalhistas.
8. Trabalho informal do doméstico
A informalidade é comum no trabalho doméstico. Além de empregadas domésticas, incluem-se profissionais como motoristas, jardineiros e outros que prestam serviços não lucrativos a pessoas físicas em âmbito residencial.
Conforme o artigo 1° da LC n° 150/2015, o empregado doméstico é aquele que presta serviços com habitualidade, subordinação, onerosidade e pessoalidade a pessoa ou família, por mais de dois dias por semana. A partir do terceiro dia semanal de trabalho, o vínculo empregatício é estabelecido.
Sem a formalização, o empregador está sujeito à fiscalização e a ações trabalhistas, podendo ser obrigado a regularizar a situação e pagar multas.
A formalização no trabalho doméstico assegura direitos básicos aos trabalhadores, como férias remuneradas, 13° salário e previdência social. Para o empregador, cumprir a legislação evita sanções e promove uma relação de confiança e respeito, essencial para o ambiente doméstico.
8.1. Cadastro Retroativo no Módulo eSocial Doméstico
Se necessário, o empregador doméstico pode realizar o registro retroativo do trabalhador, conforme o Manual de Orientação do eSocial para o Empregador Doméstico.
Para registrar admissões de meses anteriores, o empregador deve reabrir as folhas de pagamento desde a data de admissão, incluir as remunerações do trabalhador e fechar novamente as folhas, gerando as guias DAE com os valores corretos.
O cadastro retroativo permite que empregadores regularizem situações passadas, garantindo que o trabalhador tenha seus direitos respeitados desde o início da relação. Isso evita penalidades futuras e demonstra o compromisso do empregador com a legalidade e justiça.
9. Contribuições previdenciárias
Com a formalização do vínculo de emprego ou atuação como autônomo, são devidas contribuições previdenciárias específicas.
As contribuições previdenciárias são fundamentais para financiar a seguridade social, garantindo benefícios aos trabalhadores e mantendo a sustentabilidade do sistema previdenciário.
9.1. Contribuição Previdenciária do Autônomo
Quando o autônomo presta serviços a uma pessoa jurídica, a empresa contratante deve recolher o INSS sobre o valor pago, observando os limites de salário de contribuição.
A empresa deve descontar 11% do valor pago ao autônomo, conforme o artigo 37, inciso II, alínea “a” da IN RFB n° 2.110/2022 e o artigo 216, § 26 do Decreto n° 3.048/99.
O recolhimento correto das contribuições previdenciárias pelo contratante assegura que o autônomo tenha acesso a benefícios previdenciários. Isso também evita passivos fiscais e trabalhistas para a empresa, promovendo relações de trabalho regulares e sustentáveis.
9.2. Contribuição Patronal
Conforme o artigo 22 da Lei n° 8.212/91, a Contribuição Previdenciária Patronal (CPP) é de 20% sobre as remunerações pagas a empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais.
A CPP de 20% é devida por empresas tributadas pelo Lucro Presumido, Lucro Real ou Simples Nacional (Anexo IV). Empresas do Simples Nacional enquadradas nos Anexos I, II, III e V são dispensadas dessa contribuição, conforme o artigo 13, inciso VI da LC n° 123/2006.
A contribuição patronal é essencial para o financiamento da Previdência Social. As isenções para pequenas empresas visam estimular o empreendedorismo e reduzir a carga tributária, incentivando a formalização e a geração de empregos.
9.3. Alíquota Progressiva
Na formalização do vínculo de emprego, o empregador deve descontar a contribuição previdenciária do empregado com base na alíquota progressiva, conforme o artigo 28, § 1° da Emenda Constitucional n° 103/2019.
A alíquota progressiva torna a contribuição previdenciária mais justa, pois os trabalhadores com rendimentos maiores contribuem com percentuais mais altos. Isso promove a equidade no sistema previdenciário e assegura recursos para a manutenção dos benefícios.
10. Penalidades
Segundo o artigo 41 da CLT, todos os empregadores devem registrar seus empregados, podendo utilizar livros, fichas ou sistemas eletrônicos, conforme orientações da Secretaria do Trabalho.
No registro, devem constar a qualificação civil e profissional do empregado, dados sobre admissão, duração e efetividade do trabalho, férias, acidentes e outras informações relevantes.
Em caso de fiscalização, o não cumprimento dessas obrigações pode resultar em multas:
- Pelo registro de empregado (Lei n° 13.467/2017): Infração do Artigo 41 da CLT, com base no Artigo 47 da CLT. Multa de R$ 3.101,73 por empregado não registrado, acrescida de igual valor em cada reincidência.
- Pelo registro de empregado (Lei n° 13.467/2017 – ME/EPP): Infração do Artigo 41 da CLT, com base no Artigo 47, § 1° da CLT. Multa de R$ 827,13 por empregado não registrado, acrescida de igual valor em cada reincidência.
- Pela falta de atualização ou preenchimento incompleto do LRE/FRE (Lei n° 13.467/2017): Infração do Artigo 41, parágrafo único da CLT, com base no Artigo 47-A da CLT. Multa de R$ 620,35 por empregado prejudicado.
As penalidades servem como mecanismo de coerção para que os empregadores cumpram a legislação trabalhista. O registro adequado dos empregados é fundamental para a garantia de direitos e para a transparência nas relações de trabalho. O descumprimento dessas obrigações pode resultar em sanções financeiras significativas e danos à reputação da empresa.